A farmacogenômica é a ciência que estuda a influência do DNA de um indivíduo em sua resposta a medicamentos. Assim como todas as ciências genômicas, é ainda muito nova e está em constante evolução, mas, nos últimos tempos, tem sido vista por cada vez mais médicos de diferentes especialidades como uma ferramenta útil na prescrição de fármacos, especialmente para casos refratários, ou seja, pacientes que não costumam responder bem aos tratamentos com dosagem padrão.
Neste contexto de constante produção de conhecimento, é natural que novas descobertas sejam feitas numa frequência relativamente alta e que estudos mais robustos e complexos obtenham resultados diferentes de outros mais simples e com metodologia mais limitada. No caso das ciências da vida – onde se engloba a farmacogenética – é importante ter uma ferramenta para se mensurar a “confiabilidade” das evidências científicas que se tem em mãos, de modo que o prescritor não confie cegamente em informações que não necessariamente passaram por todos os crivos de validação inerentes à consolidação de um novo conhecimento – mas que também não deixam de ter lá seu valor. 
Esta ferramenta, no âmbito da farmacogenômica, é conhecida como grau de relevância, e vamos entendê-la um pouco melhor no texto de hoje.

Como entender o resultado de um teste farmacogenético

Ao adquirir um teste farmacogenético, após a coleta da amostra e liberação do resultado, você irá dar de cara com uma lista contendo seus genótipos – isto é, quais alelos você possui para os genes estudados – e, ao lado, as consequências clínicas de seu resultado. Chamamos isso de relações gene-dose, isto é, associações entre um determinado genótipo e uma determinada consequência no tratamento realizado por um dado medicamento – que usualmente tem a ver com a necessidade de um ajuste em sua dosagem ou troca por um outro fármaco. 
Dentre os genes mais importantes para a farmacogenética clínica estão os que expressam as enzimas do citocromo p450, comumente conhecidos como CYPs. As CYPs participam do metabolismo de uma gama considerável de substâncias que adentram nosso corpo e, normalmente, variantes genéticas podem tornar indivíduos metabolizadores rápidos, normais ou lentos para um determinado medicamento. Porém, as CYPs são só uma das etapas no trajeto de um medicamento desde sua ingestão até surtir o efeito. Na verdade, cada medicamento “faz seu próprio caminho”, de modo que as relações gene-dose são sempre exclusivas para um determinado fármaco ou classe de fármacos que possuam semelhança a nível molecular. 
Por isso, cada relação gene-dose tem seu próprio nível de evidências. Algo que pode parecer simples, mas é na verdade consequência do árduo trabalho de muitas pessoas.

Quem estuda a farmacogenética?

Todos os dias, centenas de novas publicações científicas são produzidas, sobre os mais diversos assuntos. Com a finalidade de organizar a produção de conhecimento, é comum que cientistas de diferentes nacionalidades se organizem em consórcios, algo como um “grupo de estudos em escala global” – especialmente quando se trata de um assunto muito complexo ou de interesse da humanidade como um todo. Foi assim com o Projeto Genoma, que levou, em 2003, ao primeiro sequenciamento do genoma humano, por exemplo.
No que tange à farmacogenética, temos, entre outros, o CPIC (Consórcio para Implementação de Farmacogenética Clínica, em tradução livre), e o PharmGKB, um projeto capitaneado por cientistas de Stanford que possui como objetivo mapear e organizar todos os estudos publicados relacionados ao assunto. O PharmGKB, ainda, é responsável pela categorização das relações gene-dose dentro do que conhecemos como níveis de evidência, como veremos a seguir.

Níveis de evidência

Estudos científicos podem ser realizados seguindo as mais variadas metodologias, a depender de fatores como recursos disponíveis e objetivos do estudo. Para se obter informações relevantes para a farmacogenética, são usados especialmente os estudos clínicos, isto é, estudos realizados em ambiente hospitalar, com pacientes reais.
Mesmo dentro do guarda-chuva dos estudos clínicos, pode haver grande variação de metodologia. Um estudo pode ser randomizado (quando os pacientes que compõem o grupo controle, ao qual será administrado placebo, são escolhidos ao acaso), ou não, pode ser duplo-cego (quando nem o paciente sabe a qual grupo pertence e nem o médico condutor do estudo sabe quais são os pacientes do controle) ou não, e a adoção destes protocolos no desenho do estudo torna-o mais confiável, uma vez que diminuem o viés – ou seja, margem para intervenção (consciente ou não) nos resultados do estudo. Se nem o paciente nem o médico sabem quem está tomando o que, não há como haver interferência no resultado (vale lembrar que o efeito placebo é de grande importância em estudos com medicamentos: é comprovado que, para um paciente, o mero acreditar ou não na eficácia de um tratamento pode influenciar no resultado). 
E é isso – entre outras coisas – que o PharmGKB leva em consideração ao criar a escala de grau de relevância que usamos. O espaço amostral (número de pacientes envolvidos no estudo), a quantidade de estudos publicados e o quão recente eles são também contribuem para o escore final de relevância científica. Além disso, evidências empíricas, o quanto se sabe sobre o funcionamento do gene em questão e mesmo a adoção das diretrizes por sistema de saúde e a opinião de agências regulatórias (como o FDA, equivalente da ANVISA nos EUA) pesam na classificação da relação gene-dose em questão. 

Fonte: PharmGKB

Nível 1a

Neste nível de evidência, já há estudos suficientes, com metodologia robusta e resultados reproduzidos e validados em diferentes coortes (isto é, pessoas de etnias diferentes) com significância estatística, de modo que já existem diretrizes clínicas claras emitidas pelo CPIC ou respaldo de agências regulatórias como o FDA.

Nível 1b

Há boas evidências a respeito da relação gene-dose em questão, em estudos robustos e bem detalhados. Para atingir o nível 1a, porém, ainda carece a validação em coortes mais diversificadas.

Nível 2a

Semelhante ao nível 2b, porém, trata-se de um gene já muito bem conhecido e estudado, de modo que é muito provável que os estudos sejam validados em testes mais robustos.

Nível 2b

Estudos mostram evidências consideráveis, porém, é possível que alguns deles tenham sido feitos com um número muito baixo de pacientes, coorte pouco diversificada ou que o efeito observado não seja tão proeminente.

Nível 3

Relação gene-dose validada por somente um estudo, ou por poucos estudos onde não houve evidências tão claras ou estatisticamente relevantes de associação.

Nível 4

Há somente estudos de caso individuais ou evidências de estudo in vitro, in silico (simulação computadorizada) ou em modelos animais. 

Como isso influencia na escolha do meu teste farmacogenético

É simples: converse com o laboratório e entenda quais evidências são utilizadas para emitir os resultados. É muito comum, para quem é leigo (e mesmo para alguns médicos), deixar-se levar pela quantidade de enzimas, genes ou fármacos analisados por uma empresa, mas isso pode levar a algumas armadilhas, especialmente se o resultado não vem devidamente acompanhado de seu nível de evidências. Mesmo as evidências em níveis moderados têm lá seu valor, desde que observadas com a devida cautela, o que só é possível se soubermos qual o nível de evidência.
No Genera Farma, todas as relações gene-dose mapeadas são devidamente acompanhadas de seu nível de evidência, logo abaixo do número do SNP: 

Exemplo de resultado do Genera Farma, com destaque para o nível de evidência

Esperamos que, munido(a) destas informações, você se sinta mais preparado(a) para escolher um teste farmacogenético!